Conheci Calasans nos idos de 1940, quando frequentava a casa de meu tio Affonso Maciel (meu padrinho), casado em segunda núpcias com minha tia Mariá, irmão de meu pai e pai de Affonso Maciel Neto. Nessa época, sempre estava em Nazaré, onde brincava com meu primo Aurelino. Justamente nesse período, Calasans já gostava de Lúcia, filha de tio Maciel, tendo contraído matrimônio em 30 de dezembro de 1941. Após o casamento, foram residir em Aracaju, sua terra natal. Na capital sergipana, advogava e participava de estudos e eventos sobre história. Do consórcio, nasceram dois filhos; José, diplomado em Direito, sendo juiz na cidade de Paramirim, vindo a falecer em 17 de maio de 1972, ocasionando um grande abalo na vida de Calasans e Lúcia, e Madalena, psicóloga, residente no Rio de Janeiro.
Sempre que se deslocavam para Salvador, Calasans e Lúcia hospedavam-se na residência de tio Maciel, até que no ano de 1948 passaram a residir definitivamente na capital baiana.
A partir dos anos 70, passamos a ter um relacionamento mais estreito, quando eu tinha a oportunidade de participar dos eventos dos quais ele atuava com suas conferências, palestras etc... O seu envolvimento maior era com a Guerra de Canudos, com a publicação de numerosos trabalhos que o notabilizaram nacionalmente, considerado que foi a maior autoridade na história daquela guerra. Entretanto, sua grande paixão, conforme declarara, era pelos acontecimentos da Revolução de 30. Com referência à Guerra de Canudos, o que conseguiu colecionar em vida, doou ao Centro de Estudos Baianos da Universidade Federal da Bahia, fundando posteriormente o Núcleo Sertão, ao qual integrou-se até o início do seu padecimento.
Fez o curso secundário no Atheneu Sergipense, na capital sergipana, onde nascera em 14 de julho de 1915. Diplomou-se pela Faculdade de Direito da Bahia, na turma de 1937. Professor da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Ufba, onde em brilhante concurso, tornou-se professor catedrático, tendo obtido o grau de Doutor, exercendo também a diretoria da faculdade, durante três anos. No período de 1980 a 1984, foi vice-reitor da Universidade Federal da Bahia, no reitorado de Luiz Fernando Macedo Costa. Dirigiu também, com invulgar capacidade durante muitos anos, o Museu Eugênio Teixeira Leal - Memorial do Banco Econômico. Ocupava a cadeira nº28 da Academia de Letras da Bahia.
Era sócio de algumas instituições culturais, sendo agraciado com várias condecorações. Atuou na direção do Senac, oportunidade em que demonstrou a seu afeto às questões do ensino, bem como teve destacada atuação na Associação dos Empregados no Comércio, ocasião em que foi homenageado com o título de Sócio Benemérito daquela entidade.
Calasans foi quem primeiro deu-me a orientação para escrever sobre a vida de Guilherme Marback, meu pai. Lembro-me desse dia, aguardava-me no Museu Teixeira Leal, era uma manhã, conversamos bastante, desejando obter, com sua clara e abalizada experiência de grande escritor que era, subsídios para o meu livro.
Mestre compreensivo, orador fluente, trilha luminosa e fecunda, José Calasans ensinou a muitas gerações. Extraordinário espírito de equilíbrio, de equidade, criatura humana singular, idôneo, mestre competente e devotado, independente e íntegro, além de alma generosa e boa.
Tive a fortuna de conhecê-lo de perto, e os momentos que com ele compartilhei foram de amabilidade, humildade, simplicidade, bondade de coração sem ostentação, arraigando-me profundamente a admiração que sempre lhe dispensei em vida.
Com o seu falecimento, desaparece um grande amigo e o grande destaque da historiografia sobre a Guerra de Canudos, respeitado entre nós e no exterior. Os que o conheceram, eram fascinados pelo encantamento de sua inteligência e erudição.
Vida inteiramente dedicada ao trabalho, dentro da mais escrupulosa honestidade.
Deixará saudades.
Texto publicado no jornal A Tarde de 11 de junho de 2001. Sylvio Marback é professor da Universidade Federal da Bahia.